quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

"Que a humanidade do menino nos induza a um crescente e profundo processo de humanização"



E Edson, meu amigo, me escreveu assim:

Lori.
 
Lembrei-me de você, lendo o texto que lhe envio em ANEXO. Que a humanidade do menino nos induza a um crescente e profundo processo de humanização. Abraços: extensivos a todos os seus. Edson 

 

Na manjedoura
( Clarice Lispector )

Na manjedoura estava calmo e bom. Era de tardinha, ainda não se via a estrela. Por enquanto o nascimento era só de família. Os outros sentiam mas ninguém via. Na tarde já escurecida, na palha cor de ouro, tenro como um cordeiro refulgia o menino, tenro como o nosso filho. Bem de perto, uma cara de boi e outra de jumento olhavam, e esquentavam o ar com o hálito do corpo. Era depois do parto e tudo úmido repousava, tudo úmido e morno respirava. Maria descansava o corpo cansado, sua tarefa no mundo seria a de cumprir o seu destino e ela agora repousava e olhava. José, de longas barbas, meditava; seu destino, que era o de entender, se realizara. O destino da criança era o de nascer. E o dos bichos ali se fazia e refazia: o de amar sem saber que amavam. A inocência dos meninos, esta a doçura dos brutos compreendia. E, antes dos reis, presenteavam o nascido com o que possuíam: o olhar grande que eles têm e a tepidez do ventre que eles são.
A humanidade é filha de Cristo homem, mas as crianças, os brutos e os amantes são filhos daquele instante na manjedoura. Como são filhos de menino, os seus erros são iluminados: a marca do cordeiro é o seu destino. Eles se reconhecem por uma palidez na testa, como a de uma estrela de tarde, um cheiro de palha e terra, uma paciência de infante. Também as crianças, os pobres de espírito e os que se amam são recusados nas hospedarias. Um menino, porém, é o seu pastor e nada lhes faltará. Há séculos eles se escondem em mistérios e estábulos onde pelos séculos repetem o instante do nascimento: a alegria dos homens.

LISPECTOR, Clarice. A manjedoura. In:­­­­______ Para não esquecer. São Paulo: Siciliano, 1992. p. 41.


Agradecido, retribuo a você, Edson, os meus abraços, extensivos a todos os seus e a todos os meus amigos, convidando a todos para o Projeto em Flor do poeta Drummond:

                               
                                Projeto em flor, candeia acesa,
                                chega Natal e nos convida
                                a juntar bondade e beleza
                                no sem-par mistério da vida.


Coral Ribeirão de Areia e a História de um Menino-Rei































Senhoras e senhores, abram suas portas, corram às suas janelas.
Saiam e venham ver, ouvir e se emocionar com a história que vamos contar.
Aqui estamos arautos de praças e ruas para representar o nascimento
mais belo que o mundo pôde ver.

Assim, encantando a todos, O Coral Ribeirão de Areia, após a Novena de Natal e a abertura     da Exposição Fotográfica, iniciou a História de um Menino-Rei, auto de Natal revisitado com músicas de domínio público pesquisadas pelos corais Trovadores do Vale e Lavadeiras de Almenara, Texto de Diêgo Alves, Direção Musical de Dêner Pinheiro, Direção de Arte de       Grace Matos e Diêgo Alves e a coloboração de Edna Rabelo, numa realização da AJENAI.
Encerrando, Maria anunciou:

Trago em meus braços o menininho Deus, "tão belo como um sim numa sala negativa,            belo porque corrompe com sangue novo a anemia, belo, porque com o novo, todo o velho contagia." Para quem tem fé, "não há melhor resposta que o espetáculo da vida."


                                                                                                     Lori Figueiró




sábado, 15 de dezembro de 2012

"... a alegria não chega apenas no encontro do achado."


 
A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca.
E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria.

                                                                                                         Paulo Freire



Maria Aparecida Marques Costa
e Laurindo Alves Pereira Santos,
Ouro Fino, Coronel Murta.

       Ana das Graças Santos Jardim
       e Geraldo Viana Jardim,
       Coronel Murta.

Maria Barbosa Silva,
Coronel Murta.

              Arnaldo Andrade Loyola,
              Coronel Murta.

Cleonice Amorim de Souza
e Geralda Souza de Amorim,
Alto Morro Redondo, Coronel Murta.

          Irene Cristina Santos Silva e
          Alexia Santos Silva,
          Ouro Fino, Coronel Murta.












Canção para os fonemas da alegria

Peço licença para algumas coisas.
Primeiramente para desfraudar
este canto de amor publicamente.

Sucede que sei dizer amor
quando reparto o ramo azul de estrelas
que em meu peito floresce menino.

Peço licença para soletrar,
no alfabeto do sol pernambucano
a palavra ti-jo-lo, por exemplo,

e poder ver que dentro delas vivem
paredes, aconchegos e janelas,
e descobrir que todos os fonemas

são mágicos sinais que vão se abrindo
constelação de girassóis girando
em círculos de amor que de repente
estalam como flor no chão da casa.

Às vezes nem casa: é o chão.
Mas sobre o chão quem reina agora é um homem
diferente, que acaba de nascer:

porque unindo pedaços de palavras
aos poucos vai unindo argila e orvalho,
tristeza e pão, cambão e beija-flor,

e acaba por unir a própria vida
no seu peito partida e repartida
quando afinal descobre um clarão

que o mundo é seu também, que o seu trabalho
não é a pena que paga por ser homem,
mas um modo de amar e de ajudar
o mundo a ser melhor.

Peço licença
para avisar que, ao gosto de Jesus,
este homem renascido é um homem novo:

ele atravessa os campos espalhando
a boa-nova, e chama os companheiros
a pelejar no limpo, fronte a fronte,

contra o bicho de quatrocentos anos,
mas cujo fel espesso não resiste
a quarenta horas de total ternura.

Peço licença pra terminar
soletrando a canção da rebeldia
que existe nos fonemas da alegria:

canção de amor geral que eu vi crescer
nos olhos do homem que aprendeu a ler.

                                                                Thiago de Melo, dedicado a Paulo Freire.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

"... nos deixarmos dissolver em outras identidades."


...
     Falamos em ler e pensamos apenas nos livros, nos
textos escritos. O senso comum diz que lemos apenas
palavras. Mas a ideia de leitura aplica-se a um vasto
universo. Nós lemos emoções nos rostos, lemos os
sinais climáticos nas nuvens, lemos o chão, lemos o
Mundo, lemos a Vida. Tudo pode ser página. Depende
apenas da intenção de descoberta do nosso olhar.
Queixamos-nos de que as pessoas não leêm livros.
Mas o deficit de leitura é muito mais geral. Não
sabemos ler o mundo, não lemos os outros.

                                                         
                                                         Mia Couto, em E se Obama fosse africano?
                                                                   Pág 103, Companhia das Letras, 2011.
 




Vanessa e Ana Clara.
São José, Coronel Murta










          
                Igor Dias
                Ouro Fino, Coronel Murta.











Maria Eduarda, Mikael e Ellen.
Pachecos, Coronel Murta.











     João Antonio e Marcos Manoel.
                 Ouro Fino, Coronel Murta










Não vale a pena saber ler ou saber escrever se não for para
nos deixarmos dissolver em outras identidades.

                                                                                        Mia Couto

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

D. Maria José, "caprichos e cuidados para mãe e filho"

                        Maria José Carvalho dos Santos e Orfeu Pinheiro de Matos


D. Maria José, benzendo Orfeu, o meninin, já quase grandim
dos meu amigos Grace Matos e Dêner Pinheiro,
na manhã do dia 28 de outubro, em Araçuaí.

Deus te gerou e Deus te criou.
Deus que te livra do mal olho
que te olhou e está por te olhar.
Porque com dois pôs, com três eu tiro,
com o poder de Deus Pai, Deus Filho
e Deus Espirito Santo.
Deus coloca a virtude.

Um dia estava Lelia sentada
na montanha, chorava,
por mode seu bento filho.
Chegou Santa Verônica e disse:
_ o que têm Lelia que tanto chora?
_Choro por mode meu filho
que está doente de quebranto,
mal olhado, mal de espanto.
_ Não chore não, Lelia,
porque seu filho não morre
nem de quebranto, mal olhado,
nem de espanto.

Depois de pronunciar as palavras três vezes, D. Maria José rezou uma Ave Maria,
um Pai Nosso e pediu que Grace oferecesse para o seu Santo de proteção, 
assim, o Santo protege com caprichos e cuidados você a mãe e o seu filho.

                                                                                                                 
                                                                                                                 Lori Figueiró

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

D. Maria das Graças e D. Maria Auxiliadora, tendo o coração arrumadinho...

                 Maria das Graças Martins Souza e Maria Auxiliadora Martins Santos

Hoje, pela manhã em Mutuca, comunidade de Coronel Murta,
tive o prazer em conhecer D. Maria das Graças e D. Maria Auxiliadora.
Demonstrando muita vitalidade e uma alegria contagiante, foram logo
me servindo um cafezinho fresco colhido no quintal, e o convite para o
almoço, feijãozinho com quiabo, também colhido lá na horta.
Entre os tantos afazeres domésticos e o trabalho na lavoura,
são cantadoras de versos, batuqueiras e benzedeiras.
Os ofícios, aprenderam com as avós e mais dedicadamente, com os pais
Amélia Moreira Santos e Manoel Martins Santos.
Gêmeas, nasceram a 59 anos, no dia 26 de junho de 1953. Já tamos duas velhas,
seu moço, como a serra lá fora e o mato em volta, mas vamo levando a vida
e não esquecemos nunca do aniversário nosso de nascença.
Eu a derradeira, minha mãe contava que eu nasci depois, sei que vou embora
primeiro, mas num faz importância, tendo o coração arrumadinho, cheio de Deus,
tá bão! Me confessou D. Maria Auxiliadora, enquanto na porta da sala,
D. Maria das Graças recebia umas meninas para serem benzidas.


D. Maria das Graças 
   benzendo Ana Clarice. 

                     D. Maria das Graças
                        benzendo Mirele.
               










D. Maria das Graças
   benzendo Ana Paula.











E D. Maria das Graças repetia três vezes:

Eu te benzo de quebranto e mal olhado.
Com dois te pôs.
Com três eu te tiro.
Com os poderes de Deus,
do Espírito Santo e da Virgem Maria,
Amém!

E rezava uma Ave Maria, uma Santa Maria, um Pai Nosso e pedia
a cada uma das meninas para oferecerem para os seus santos de devoção.


Na despedida, D. Maria das Graças me aconselhando:
não esqueça nunca seu moço, devoção primeiramente com Deus,
que está lá no céu  e depois com Nossa Senhora, que é a mãe de Deus
e a nossa mãe também.
Prometendo que eu voltaria o mais breve possível, prometi ainda uns retrato,
aqui é muito custoso e esta máquina do senhor deixa a gente muito clarinha,
seremos agradecidas rezando para o senhor, eu e minha irmã, obrigado seu moço!


                                                                                                           Lori Figueiró





quarta-feira, 21 de novembro de 2012

D. Gera, "a alegria é o tempero da vida."


                                Geralda Martins Soares e os bisnetos Thaís e Erick






Parteira em Jenipapo de Minas, D. Gera, mãe Gera, recebeu em suas mãos
mais de setecentas criançaspara admirar com apreço as cores da vida
recebendo de Deus as bênçãos, como me confidênciou quando nos conhecemos.
Filha, neta e bisneta de parteiras, iniciou-se no oficio de parteira, realizando
três partos antes do nascimento de seu primeiro filho, ainda aos dezesseis anos.
Mãe de dez filhos, dois foram chamados para a convivência com Deus antes de um
aninho de vida e Beto ( José Roberto ) homem feito, tem 13 netos e 2 bisnetos.
Com as suas filhas, genros, netos e bisnetos integram o Grupo de Consciência Negra
e Resgate. Com a sua força e sabedoria, mãe Gera é a linha e o ponto que
perpassa as relações dos integrantes deste grupo.
Revendo alguns registros de nossas primeiras conversas:
A vida da gente, a gente não sabe aonde que fica, né. Não sabe como é o traço
da vida da gente. A gente muito bem, aí, mas o final da vida ninguém sabe o
quê que arresulta.
Em um outro momento: O mundo muita volta e não sei de quem serei.
No último domingo, instantes antes da Missa da Consciência Negra enquanto
eu a registrava em companhia de Thaís e Erick, seus bisnetos;
- eu nasci, Lori, para viver alegre, não gosto de tristeza, tudo o que incomoda
eu não carrego, jogo tudo pra trás e sigo a vida e sei que assim é melhor, que
assim deve de ser. Hoje, eu com o coração apertado, queria todos meus
filhos aqui do lado meu, comigo, e mermo assim não deixo de alegre, ocê
deve de saber, a alegria é o tempero da vida, num é mermo?
E assim, recordando a minha amiga Rosa, vou reconhecendo em mãe Gera
a sua nobreza.


                                                                                                     Lori Figueiró