Helena Siqueira Torres
Sábado, final de tarde, assim que D.
Helena recebeu das minhas mãos
as suas fotografias e um exemplar de
Histórias da Terra Mineira de
Carlos Góes, ela, de pronto, declamou:
Bárbara bela,
Do Norte estrela,
Que o meu destino
Sabes guiar;
De ti ausente
Triste somente,
As horas passo
A suspirar.
Bárbara Heliodora, ela, Lori, ficou
perturbada com a ausência do marido.
É, quantos anos, o tempo voa,
parece que foi ontem, eu tava com uns onze
anos, a gente entrava na escola com
sete, D. Maria Inês, Maria Inês dos Santos,
tia de Geraldinho, professora boa,
boa mesmo, mas brava, brava só se vendo, e
naquele tempo,
Lori, era as Histórias
da Terra Mineira e
os Manuscritos, os
Manuscritos, aquela
garrancheira toda, hoje, eu
num sei não, acho
que eu num
conseguiria ler
não, D. Maria Inês falava: Helena,
a gente levantava e
lia uma
história, depois
outra vez para corrigir
a pontuação e outra
vez, três vezes,
entrava ano e
saía ano a mesma
coisa, o livro das
terras mineiras, os
Manuscritos e
no último ano, eu
me lembro, Rui Barbosa,
era assim, num
tinha livro, só
esses e aquele caderninho
de oito folhas, muitas
vezes aquelas
linhas apagadas,
a caneta de tinteiro,
derramando, rebocando tudo...
até parece
um sonho, às
vezes, Lori, eu fico
pensando, parece fantasia,
mas depois eu digo,
foi assim mesmo
e se não fosse
a minha vó, aqui
o tempo todo cachimbando,
graças a Deus,
Lori, eu tive ela,
porque para o meu
pai e minha mãe
eu vivia só na
roça, no
trabalho com eles, minha
vó é que insistia,
insistia e fazia eu
ir na escola,
se não, Lori,
nem o terceiro ano
eu tinha, analfabeta de
tudo, mas minha vó,
que Deus
a tenha,
agradeço muito a ela,
ela que me obrigava,
me ensinou croché, bordar,
me
tomava a
tabuada e as lição,
sem saber ler, coitada,
mas me fazia ler,
ler e repetir,
como D. Maria
Inês, horas a fio
e é assim, como eu
digo, parece um sonho,
no
meu tempo não
dava para acreditar que
o mundo ía mudar
tanto, computador que
eu nunca usei
e nem sei se
vou usar, celular, as
televisão, tanta novidade,
cadê as
certezas todas
do meu pai e
do povo todo, num
é, eu pergunto mesmo,
aonde que nós
vão parar, num
é, num dá nem
para acreditar... você vê,
penso que só temos
que ir
levando a vida
e fazendo o bem,
num é mesmo?
Sim, e falei com D. Helena de As
ensinanças da dúvida,
Tive um chão ( mas já faz tempo )
todo feito de certezas
tão duras como lajedos.
Agora ( o tempo é que o fez )
tenho um caminho de barro
umedecido de dúvidas.
Mas nele ( devagar vou )
me cresce funda a certeza
de que vale a pena o amor.
poema de Thiago de Mello, que eu havia
declamado para Sr. Nestor no ínicio da
manhã enquanto delongavamos sobre as
dúvidas e incertezas da vida.
Lori, a única
certeza, meu prezado, é
que para a morte
não tem tempo ruim,
mais
dia menos dia,
ela chama todos para
o seu convívio. Eu
tô aqui, só me
faltava uma
coisa na vida,
uma pessoa para eu
abraçar aqui com estas
mão e ele tá
chegando,
tá a caminho,
você sabe, a minha
família, dez filhos, tenho
ainda oito, vinte cinco
netos e doze
bisnetos, e o que
me faltava, tá batendo
na porta, um tataraneto,
um bisneto meu
encomendou e eu tô
aqui esperando ele... um
presente...
uma alegria sem
cabimento, quem diria...
Re visitar!
ResponderExcluirPontos de Partida...
Belos trabalhos.