sábado, 29 de junho de 2013

Em Sete Canais, Coronel Murta, "as tardes com essências inodoras de crepúsculos"


                              Joaquim Cardoso Barbosa e Alzira Pereira de Souza







D. Alzira e a mãe
Teodomira Francisca de Souza







Quando fui recebido, em companhia de Silvano dos Santos, por Sr. Joaquim Cardoso,
na sua casa, em Sete Canais, comunidade de Coronel Murta, refletia sobre o trabalho
exaustivo de atribuir sentidos a tudo, como sentencia Bartolomeu Campos de Queirós
em Vermelho Amargo, reconhecendo ainda que dar sentido é tomar posse dos predicados.
Numa casa banhada pela solidão e pela luz do cerrado, Sr. Joaquim Cardoso, delatando
prosas e sorrisos, confidênciou: moço, quando a gente acomoda um pouco que seja,
numa madorna assim pouguinha, a gente acaba assuntando umas coisas diferentes,
cismando com a vida e ventania. Coisas de Deus e do mundo, nosso mundo grande
de meu Deus. E tudo de conformidade, é, na conformidade e abundância, uma fartura
de tudo. Palavras que traduziam a felicidade de estar comemorando com D. Alzira
58 anos de casados, 8 filhos, 6 netos e 2 bisnetos frutos e presentes de Deus que é pai e
protetor, os incomodos e as dúvidas com a eficácia de uma cirurgia de catarata que
havia se submetido a poucos dias, e a dor de se ver como o último de uma linhagem de
8 irmãos e de pais que se foram a muito. Sou o derradeiro seu moço, como Deus quis
e eu nos conforme. A vida é assim, não devemos desesperar, de nada vale o desconsolo.
Hoje, na proteção de Deus, moro aqui sozinho com Alzira, minha patroa,
cuidando um do outro e da mãe dela. A coitada, uma pena, não dá cor de quase
mais nada, uma pena, foi perdendo o juízo de uns poucos tempo pra cá, num
repente só, também não é pra menos, ela é de 1911, cento e poucos ano, muita vida.
E eu, já vou caminhando os meu 83 ano e a filha dela já com 80, Deus é pai.
Ao cair da tarde, prometendo que a prosa regada a biscoito de polvilho, bolo de fubá
e café fresquinho seria retomada em breve, nos despedimos de Sr. Joaquim Cardoso e
D. Alzira por entre as réstias de uma luz filtrada por um frondoso pé de Tamboril, plantado
pelo anfitrião na barra do córrego da Mumbuca, um dos sete canais, quando este ainda
correndo em águas cristalinas e abundantes, desaguava no rio Salinas.
Na viagem de volta, contemplando a beleza agreste de um cerrado castigado pela seca,
voltei às páginas de Vermelho Amargo, trazendo para o mais íntimo de mim a tarde,
as tardes, com essências inodoras de crepúsculos. na certeza de que chamar pelo nome
o visível e o invisível é respirar consciência,


                                                                                                           Lori Figueiró




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